Além de ter um objetivo estratégico, o movimento também visa chamar a atenção – em um dos fóruns mais importantes do mundo – para uma questão que já vem sendo observada há anos: a influência da emergência climática na saúde dos indivíduos.
Dados do Painel Intergovernamental sobre Mudança do Clima (IPCC) indicam que 3,5 bilhões de pessoas – quase metade da humanidade – vivem em áreas vulneráveis a alterações climáticas. A Organização Mundial da Saúde (OMS), por sua vez, estima que a quantidade de pessoas com mais de 65 anos que foram a óbito por causas relacionadas ao calor aumentou em 70% nas duas últimas décadas. Além disso, um estudo recente da revista Nature nos mostra a real dimensão do problema: 58% das doenças infecciosas são agravadas por eventos climáticos extremos, como chuvas intensas e inundações, ondas de calor e longos períodos de seca.
Assim, a população se torna mais vulnerável enquanto o cenário se torna mais propício para o surgimento de novas pandemias. E sabemos que, apesar da crise climática ser um problema global, ela não afeta igualmente a todos. São em regiões subdesenvolvidas, com populações em estado de vulnerabilidade, que o resultado é ainda mais devastador.
No Brasil, já temos sentido o impacto dessas projeções. As queimadas pioram a qualidade do ar e ocasionam problemas respiratórios que podem levar à intoxicação. As chuvas, cada vez mais comuns nesta época do ano, aumentam a transmissão de doenças como chikungunya, zika e dengue; e as mudanças climáticas propiciam o ressurgimento de vírus, especialmente os agentes transmissores de doenças tropicais, como o caso do sorotipo 3 – um dos vírus causadores da dengue, identificado recentemente após mais de 15 anos sem registro no país.
Esses dados alarmantes geram não só preocupação como um grande desconforto, considerando o potencial do Brasil quando falamos de meio ambiente e produção científica. Somos o país com a maior biodiversidade do mundo, com mais de 116 mil espécies animais e mais de 46 mil espécies vegetais espalhadas por um território que se estende por metade da América do Sul, com diferentes zonas climáticas que favorecem a formação de biomas únicos.
Nossa população é extremamente miscigenada, com comunidades tradicionais representadas por mais de 200 povos indígenas e por comunidades como quilombolas, povos caiçaras e seringueiros, que têm um conhecimento milenar de como utilizar nossa biodiversidade não apenas para combater as mudanças climáticas, como para desenvolver ciência que seja capaz de cuidar da saúde da humanidade em momentos de crise sanitária. E justamente são esses povos, ainda hoje, os que se encontram em situação mais vulnerável, já que carecem de estudos clínicos e protocolos científicos dedicados.
A OMS vê a saúde das pessoas e a do planeta de forma integrada, a partir do conceito de One Health, algo que ficou ainda mais evidente durante a pandemia de Covid-19. Essa discussão finalmente ganhar espaço em um evento que terá a atenção de todo o mundo reforça a importância – como a urgência – de entendermos que planeta saudável é humanidade saudável.
*Marina Domenech, fundadora da SAIL for Health