O Centro de Hematologia de Ribeirão Preto, que apoia o Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (HCFMRP) da USP, vai receber um aporte financeiro de cerca de R$ 50 milhões para desenvolver uma nova terapia celular com células CAR-NK para tratamento oncológico. Este investimento vem do edital Mais Inovação Brasil, apoiado pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), Finep e Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT).
O projeto intitulado “Células CAR-NK anti-CD19 alogênicas para linfoma não-Hodgkin de células B recidivado/refratário: do desenvolvimento ao estudo clínico fase I” tem como objetivo criar uma solução inovadora e inédita no Brasil, empregando células CAR 19-NK para aplicação clínica.
“As células CAR-NK representam uma forma de terapia celular em que combinamos células NK (natural killer) do sistema imunológico com um receptor quimérico de antígeno, projetado para reconhecer especificamente as células tumorais. Esta terapia é similar à das células CAR-T”, explica Virgínia Picanço e Castro, coordenadora do Laboratório de Biotecnologia do Centro de Hematologia de Ribeirão Preto e uma das principais pesquisadoras.
A abordagem alogênica, que utiliza células de doadores saudáveis e prontas para uso (off the shelf), oferece acesso mais rápido e seguro ao tratamento, eliminando a necessidade de um produto autólogo, que é caro e complexo de produzir. As novas células serão integradas com um vetor CAR de 4ª geração, desenvolvido pelos pesquisadores do centro, o que potencializa a eficácia da terapia.
Benefícios
De acordo com Virgínia, as células CAR-NK têm um menor risco de efeitos colaterais, como a síndrome de liberação de citocinas ou neurotoxicidade, comuns nas terapias com células CAR-T.
“Além disso, a disponibilidade imediata das células CAR-NK, produzidas a partir de um doador saudável, congeladas e prontas para uso, elimina o tempo de produção necessário para as células CAR-T.”
Essas células são mais seguras, afirma a pesquisadora, possuem um ciclo de vida mais curto e são capazes de identificar e destruir células tumorais antes de sua morte, oferecendo uma proteção adicional. Sua atividade antitumoral é inerente, o que potencializa a capacidade das células NK. Além disso, enquanto as células CAR-T levam cerca de duas a três semanas para serem coletadas e modificadas, as células CAR-NK podem iniciar o tratamento imediatamente, o que é crucial para cânceres agressivos que necessitam de intervenção rápida. Virgínia destaca que o principal desafio é desenvolver métodos eficazes e consistentes para expandir essas células em larga escala, assegurando sua funcionalidade, segurança e reprodutibilidade.
Perspectivas Futuras
Esta iniciativa complementa os estudos com a terapia CAR-T já em andamento na instituição, buscando alternativas acessíveis para um número maior de pacientes. A terapia com células CAR-NK deve beneficiar pacientes que não podem esperar pela produção das células CAR-T, seja por estarem muito doentes ou por não possuírem células T saudáveis.
“Ao finalizar o projeto, esperamos criar um produto aplicável clinicamente, contribuindo para o avanço da pesquisa em terapias celulares e oferecendo novas possibilidades no tratamento de leucemias e linfomas. Desenvolver a terapia com células CAR-NK representa uma abordagem promissora no combate ao câncer, com vantagens em termos de segurança, eficácia e acessibilidade”, destaca Virgínia.
Até o momento, os pesquisadores concluíram a prova de conceito das células CAR-NK, demonstrando sua capacidade de eliminar células tumorais através de testes in vitro e in vivo.
“Com o novo investimento, seremos capazes de avançar significativamente na produção dessas células. Os recursos permitirão a manutenção do laboratório dentro dos rigorosos padrões de qualidade exigidos e iniciar a produção em maior escala, assegurando segurança, eficácia e consistência. Iniciaremos os estudos não clínicos, seguindo todas as diretrizes da Anvisa, incluindo estudos de toxicidade e farmacocinética, para garantir a segurança e eficácia deste novo tratamento. O objetivo é realizar todos os estudos não clínicos, iniciar a fase 1 e, se bem-sucedidos, avançar para a fase 2, visando futuramente disponibilizar essa nova terapia para a população brasileira.”
Reconhecimento
Com a pesquisa sobre o uso de células NK, o Centro de Hematologia de Ribeirão Preto está entre os finalistas da 15ª edição do Prêmio Octávio Frias de Oliveira na categoria Inovação Tecnológica em Oncologia. O trabalho destacado é “Potencializando a Imunoterapia com células NK: Desenvolvimento de um novo vetor NK-CAR.19 coexpressando o complexo IL-15/IL-15Ra”, que resulta em células NK independentes de IL-2 com elevado efeito antitumoral in vivo.
A premiação é promovida pelo Instituto do Câncer do Estado de São Paulo (Icesp), em parceria com o Grupo Folha, para estimular a produção de conhecimento sobre prevenção e combate ao câncer no Brasil. Os melhores trabalhos e as personalidades em destaque em Oncologia foram anunciados no dia 8 de agosto em São Paulo.